Artigo – 1ª Publicação

07/02/2024

A TRÍPLICE FRONTEIRA NO EXTREMO NORTE DO BRASIL:
O FORTE SÃO JOAQUIM DO RIO BRANCO E O INÍCIO DA CAPITAL
DO ESTADO DE RORAIM

Graciete Guerra da Costa

A capital do estado de Roraima, Boa Vista, é a mais setentrional do Brasil: está localizada no extremo Norte do País, a 02° 49’ 12” N e 60° 40’ 19” W, à margem do Rio Branco, perto da tríplice fronteira entre o Brasil, a Venezuela e a Guiana, é a única capital totalmente acima da Linha do Equador. Roraima está numa região de difícil acesso, no espaço amazônico, numa região fronteiriça – o que, no caso brasileiro, representa certa dinâmica de isolamento, uma vez que se insere na periferia do Estado nacional.

A etimologia do nome do Estado denuncia forte presença da cultura indígena: Roraima é formado pelos radicais Roro-imã, que na língua Macuxi significa Monte Verde; para os índios Pemón/Taurepang quer dizer, também, Mãe dos Ventos.

Nos séculos XVI, XVII e XVIII, as terras que constituem o estado de Roraima despertaram a cobiça de holandeses, espanhóis e ingleses. Em 1741, o holandês Nicholas Horstman chegou ao Rio Branco pelo território que hoje é a República da Guiana e desceu o Rio Tacutu, passou pelo Rio Branco, até chegar no Rio Negro, que banha a cidade de Manaus, no Amazonas.

Os espanhóis chegaram ao território de domínio português, depois do Tratado de Madri, em 1750, pela
Venezuela, adentrando a cabeceira do Rio Orinoco e seus afluentes. Na invasão, estabeleceram-se às margens do Rio Uraricoera, que nasce na fronteira do Brasil com a Venezuela, onde fundaram três núcleos populacionais: Santa Rosa, São João Batista de Caya-Caya e Santa Bárbara.

Ao tomar conhecimento das invasões de holandeses e espanhóis, o rei D. José I determinou que se construísse um Forte à margem do Rio Branco. O Forte de São Joaquim do Rio Branco fica localizado no encontro dos rios Tacutu e Uraricoera, que se juntam para formar o Rio Branco. O ponto era estratégico porque o rio Uraricoera serviu de entrada de espanhóis oriundos da Venezuela, e o Tacutu era utilizado pelos holandeses vindos do Suriname para chegar ao Amazonas.

As fortalezas erguidas na Amazônia nos séculos XVII e XVIII representaram a estratégia ibérica a favor de eficientes políticas de defesa. No Mapa do triângulo pode-se constatar essa estratégia de defesa, no arco da fronteira Norte do Brasil.

Figura 1 - Triângulo e os Pilares Mestres da Amazônia no Século XVIII. Fonte: FERREIRA, Viagem Filosófica, 2007.
Figura 1 – Triângulo e os Pilares Mestres da Amazônia no Século XVIII. Fonte: FERREIRA, Viagem Filosófica, 2007.

Do século XVII ao século XX passaram pelas missões amazônicas os capuchinhos, os mercedários, os franciscanos, os carmelitas, os dominicanos e os jesuítas. Para Roraima vieram os carmelitas.

Figura 2: Mapa de Roraima. Tem a localização do Forte de São Joaquim do Rio Branco e das posições espanholas construídas no Uriracoera. A missão do Pirara2 ficou em território inglês após a delimitação da fronteira. Fonte: IPHAN. FORTE SÃO JOAQUIM DO RIO BRANCO – PROCESSO Nº 1504-T-02. Estudo Histórico, Rio de Janeiro, 2011.
Figura 2: Mapa de Roraima. Tem a localização do Forte de São Joaquim do Rio Branco e das posições espanholas construídas no Uriracoera. A missão do Pirara2 ficou em território inglês após a delimitação da fronteira. Fonte: IPHAN. FORTE SÃO JOAQUIM DO RIO BRANCO – PROCESSO Nº 1504-T-02. Estudo Histórico, Rio de Janeiro, 2011.

O Forte de São Joaquim do Rio Branco foi construído, em 1775, pelo alemão Felipe Frederico Sturm, enviado para destruir instalações estrangeiras e garantir a posse da terra; mas o abastecimento do forte, muito isolado, era problema a ser enfrentado, bem como as relações com os indígenas.

 

Figura 3: Planta do Forte São Joaquim, em Roraima, 1787. Fonte: AHEx - Arquivo Histórico do Exército, Rio de Janeiro.
Figura 3: Planta do Forte São Joaquim, em Roraima, 1787. Fonte: AHEx – Arquivo Histórico do Exército, Rio de Janeiro.

O forte com seu comandante e seus subordinados seria o instrumento da política portuguesa. Para tanto, os indígenas eram imprescindíveis, tanto na construção quanto na qualidade de exímios conhecedores da região.

Figura 4: Mapa do Rio Branco, em Roraima. Provavelmente trata-se de uma cópia do reconhecimento de Felipe Sturm, de 1775, parece ser a única imagem conhecida da missão Santa Rosa, que aparece como “quartel” e “forte”, situado um pouco acima da junção do rio Uriracoera com o rio Tacutu 3. Fonte: AHEx - Arquivo Histórico do Exército, Rio de Janeiro.
Figura 4: Mapa do Rio Branco, em Roraima. Provavelmente trata-se de uma cópia do reconhecimento de Felipe Sturm, de 1775, parece ser a única imagem conhecida da missão Santa Rosa, que aparece como “quartel” e “forte”, situado um pouco acima da junção do rio Uriracoera com o rio Tacutu 3. Fonte: AHEx – Arquivo Histórico do Exército, Rio de Janeiro.
Figura 5: Prospecto da Fortaleza de São Joaquim, situada na margem oriental da foz do Rio Tacutu, na distância de 102 léguas de sua foz. (Codina), p. 265 do Vol. III. Fonte: FERREIRA, 2007.
Figura 5: Prospecto da Fortaleza de São Joaquim, situada na margem oriental da foz do Rio Tacutu, na distância de 102 léguas de sua foz. (Codina), p. 265 do Vol. III. Fonte: FERREIRA, 2007.

Da mesma forma como procedeu em Marabitanas, em 1767, Felipe Sturm situou o Forte São Joaquim do Rio Branco de forma retangular, no eixo de simetria da povoação. Em Marabitanas, no Rio Negro, a forma era quadrada. A escassez de materiais e mão-de-obra fez com que Sturm optasse por construir o forte em pedra. Na falta de cal para fazer a argamassa, utilizou barro na junção das pedras. A construção estilo Vauban fi cou, por esse motivo, menos resistente.

Figura 6: Planta e elevação do Forte São Joaquim do Rio Branco. Desenho a pena, aquarelado por Antonio Landi. Pág. 93 do Vol. II. Fonte: FERREIRA, 2007. Fonte: FERREIRA, 2007.

Figura 6: Planta e elevação do Forte São Joaquim do Rio Branco. Desenho a pena, aquarelado por Antonio Landi. Pág. 93 do Vol. II. Fonte: FERREIRA, 2007. Fonte: FERREIRA, 2007.

Examinando a planta do forte, figura 6, pode-se ver dezesseis canhoneiras. Segundo Adler Homero, dez canhões foram fundidos em outubro de 1763, na capital do Pará, inclusive duas peças de bronze.

O forte era pequeno, tinha cerca de 18 metros em seu lado maior, muralhas baixas (5,4 m) e um reparo. O espaço reservado aos canhões era estreito, de forma que somente canhões pequenos poderiam ser instalados. Sturm pôde construir baluartes plenos na frente, na parte posterior foram feitos meio baluartes.

As instalações para a guarnição do forte eram desconfortáveis, e abrigavam quando muito 15 ou 16 praças. Além das precárias instalações, o forte era vulnerável às águas do rio e inundações, que subiam de 60 a 90 cm nas enchentes.

A Viagem Filosófica de Alexandre Rodrigues Ferreira durou quase dez anos (1783-1792), e está entre as importantes expedições no Século XVIII à Amazônia Brasileira. Ela descreveu as riquezas naturais e produziu como resultado registros históricos, mapas, plantas arquitetônicas, além de coletas de espécies, muitas ainda desconhecidas por mais de dois séculos. Na visita à região do Forte de São Joaquim do Rio Branco, em 1786, elaborou iconografia, como o Prospecto da Fortaleza de São Joachim; Planta da Fortaleza de S. Joachim; Planta da Capela e Residência do Capelão do Forte de São Joachim. Os desenhos das plantas e das duas vistas do forte foram feitas por Antônio José Landi, arquiteto italiano de Bolonha, que veio ao Brasil em 1753, junto com Felipe Sturm, na Comissão Demarcadora de Limites.

O capitão Sturm morreu em setembro de 1778 e foi sepultado na parte externa do Forte São Joaquim, no terreno que servia de cemitério, fato relembrado por Ribeiro de Sampaio, quando afirmou que a obra havia sido edificada conforme o risco (desenho) do engenheiro, que “[…] que assistiu á ella quasi todo o tempo que durou a execução”.

Em maio de 1822, a guarnição reduziu-se a sete soldados. Quase dez anos depois, em 1831, Baena, no Ensaio Corográfico sobre a Província do Pará, informou que o forte era o mais bem conservado das fronteiras.

O ambiente do Forte São Joaquim do Rio Branco se complicou quando forças militares e o Comissário de Fronteiras, Coronel João Henrique de Matos, foram enviados para tratar com os ingleses.

O isolamento tornava o abastecimento do forte um problema a ser enfrentado, bem como as relações com os indígenas. Para ter alimento era preciso contar com a habilidade do gentio e, ao expulsar e maltratar os indígenas, a  administração portuguesa também eliminava sua fonte de sustento. A solução encontrada por Manoel da Gama Lobo de Almada, em 1789, foi a criação de fazendas de gado para alimentar as pessoas, aproveitando o capim dos lavrados da região. As primeiras reses eram oriundas de Tefé e foram transportadas em barco a remo. Até então, os índios não conheciam o gado bovino.

As Fazendas Reais localizaram-se nas terras firmes do Alto Rio Branco. Nesse contexto, surgiu, em 1830, a primeira fazenda particular, denominada Boa Vista, de propriedade do antigo capitão e comandante do Forte São Joaquim, Inácio Lopes de Magalhães, distando 32 km do referido forte; a fazenda se localizava junto à Freguesia de Nossa Senhora do Carmo, com os primeiros  núcleos familiares e a relevância do indígena no trabalho da pecuária. Em 1850, o povoamento da capitania de São José do Rio Negro foi elevado à categoria de província do Amazonas, estabelecendo a Freguesia de Nossa Senhora do Carmo.

No dia 09 de julho de 1890, pelo Decreto Estadual n. 49, do governador Augusto Ximeno de Villeroy, a freguesia ganhou o status de vila, mas apenas em 1926 a Vila de Boa Vista ganhou o foro de cidade.

A Vila de Boa Vista estabeleceu-se ribeirinha por razões de mobilidade, já que o transporte fluvial era o único meio de acesso e comunicação na província do Amazonas. Através das embarcações é que as mercadorias chegavam ao comércio local. As habitações eram alinhadas em direção ao Rio Branco. Nesse período, a Igreja Matriz Nossa Senhora do Carmo, o Hospital Nossa Senhora de Fátima e a sede da Intendência eram as únicas instituições públicas.

Entre as décadas de 1920 e 1930 a mineração foi introduzida como a nova atividade econômica; a extração de ouro e diamante no Norte de Boa Vista impulsionou a economia local, criando setores de comércio destinado à venda de ouro, mudando assim o cenário urbano.

Em 1924, a expedição do explorador norte-americano Hamilton Rice Jr., que trazia sua equipe em uma chalupa, transportava também um pequeno hidroavião, de sua propriedade. Esse avião foi o primeiro a sobrevoar a região do vale do Rio Branco e a registrar a primeira fotografia aérea da cidade de Boa Vista.

Figura 7 – Primeira fotografia aérea de Boa Vista, 1924. Fonte: Expedição de Hamilton Rice Jr.
Figura 7 – Primeira fotografia aérea de Boa Vista, 1924. Fonte: Expedição de Hamilton Rice Jr.

Essa expedição forneceu iconografia preciosa sob a forma de fotografias aéreas, que apresentaram o aspecto de Boa Vista já no primeiro quartel do século XX: uma cidade com 164 casas simples, população de 1.200 pessoas, composta de brasileiros, portugueses, mestiços, índios e alguns negros oriundos da Guiana Inglesa (hoje República da Guiana).

Nessa época, havia escassez de alimentos como verduras, ovos, frutas e até mesmo leite, por incapacidade de produção, uma vez que o trabalho do homem do campo estava dedicado às atividades extrativistas da balata e da borracha, deixando a agricultura e a pecuária em estado deplorável. Apesar das carências enfrentadas no dia a dia, a população revelava um elevado nível de moralidade e educação doméstica graças à atuação religiosa com professores que exerciam grande influência na cidade.

As maiores expressões arquitetônicas se consubstanciam nas obras ligadas à presença da Igreja Católica: a Igreja Matriz de Nossa Senhora do Carmo; a Prelazia; a Igreja de São Sebastião, sede da antiga Fazenda Boa Vista; a Intendência, residência do Sr. Antonio Augusto Martins; além delas, destaca se a residência dos fazendeiros Bento Brasil e Adolfo Brasil e algumas poucas edificações em alvenaria de tijolos, poucas residências, sendo o restante em taipa, num total de quarenta e nove casas.

Figura 8: Ruínas do Forte São Joaquim. Fonte: A autora, 2013.
Figura 8: Ruínas do Forte São Joaquim. Fonte: A autora, 2013.

A cidade possuía ordenamento em seu traçado, com três ruas paralelas ao rio Branco e cinco transversais ao longo da baixada em sua orla. No ano de 1943, o munícipio de Boa Vista ganhou autonomia, passando a ser Território Federal do Rio Branco, quando o presidente Getúlio Vargas nomeou o capitão Ene Garcez dos Reis como governador. A malha urbana da cidade restringia-se a cinco avenidas e quatro ruas, formando um trapézio, permanecendo assim até o ano seguinte. A situação da cidade era precária, com poucas casas de alvenaria, a maioria era de taipa coberta de palha. Não havia nenhum prédio que pudesse abrigar a sede do governo; então ele foi instalado na Prelazia do Rio Branco.

Figura 9: Antiga sede da Fazenda Boa Vista. Fonte: A autora, 2020.
Figura 9: Antiga sede da Fazenda Boa Vista. Fonte: A autora, 2020.

A cidade possuía 217 mocambos e 122 casas de alvenaria ou madeira, com a população subnutrida; 100% da população já haviam contraído malária, além de verminose, sífilis, tuberculose, entre outras doenças. A água consumida não era tratada, vinha direto do Rio Branco, que se encontrava poluído pelos dejetos das habitações.

O desenho urbano configurou-se em plano ortogonal, cujo polígono delimitava-se nas Ruas João Pereira de Melo; Getúlio Vargas, Silvio Lofego Botelho e Floriano Peixoto, a última rua caracterizada pela presença do Rio Branco banhando a margem. Esse era o embrião do que viria a se tornar a capital Boa Vista antes da implantação do plano urbanístico.

Figura 10: Mapeamento Urbano – Boa Vista - 1900. Fonte: Acervo da Divisão de Patrimônio Histórico do Estado de Roraima.
Figura 10: Mapeamento Urbano – Boa Vista – 1900. Fonte: Acervo da Divisão de Patrimônio Histórico do Estado de Roraima.

Nesse cenário de calamidade pública, o governador Ene Garcez solicitou ao governo central em seu relatório: saneamento básico para Boa Vista; socorro para a população diante da ocorrência quase endêmica de doenças tropicais; fornecimento de água potável para a população; construção de fossas sépticas e rede de esgoto em Boa Vista e demais povoados; fomento na produção de leite, aves, ovos, hortaliças e frutas em quantidade compatível com as necessidades da população.

Eis alguns dados relevantes para compreensão de como se instalou e desenvolveu esse núcleo que, mais tarde, viria se tornar Boa Vista, a capital do estado de Roraima.

 

REFERÊNCIAS

ALMADA, Manuel da Gama Lobo de. Descrição Relativa ao rio Branco e seu Território [1787]. In: Revista Trimestral do Instituto Histórico e Etnographico do Brasil – Tomo XXIV. Rio de Janeiro, n° 4, 1861, p. 617-683.

BAENA, Antônio Ladislau Monteiro. Ensaio Corográfico sobre a Província do Pará. Brasília: Senado Federal, 2004.

BARROS, Joaquim Pereira de. Plano do Forte de S. Joaquim do Rio Branco, s.d. Mss. Biblioteca Nacional.

 

COSTA, Graciete Guerra da. “As Cidades Amazônicas na América Portuguesa”. In: V Simpósio LusoBrasileiro de Cartografia Histórica, Petrópolis – RJ, 2013.

COSTA, Graciete Guerra da. “Fortificações da Amazônia”. In: NAVIGATOR Nº 20, Rio de Janeiro, 2014.

COSTA, Graciete Guerra da. Fortes Portugueses na Amazônia Brasileira. Tese (Pós-doutorado – IREL/UnB) – Universidade de Brasília, Instituto de Relações Internacionais, Brasília, 2015.

FARAGE, Nádia. As Muralhas dos Sertões: os povos indígenas no Rio Branco e a colonização. Rio de Janeiro: Paz e Terra; ANPOCS, 1991.

FERREIRA, Alexandre Rodrigues. Viagem ao Brasil. A Expedição Philosóphica pelas Capitanias do Pará, Rio Negro, Mato Grosso e Cuyabá (3 vols.). Rio de Janeiro: Kapa Editorial, 2007.

IPHAN. FORTE SÃO JOAQUIM DO RIO BRANCO – PROCESSO Nº 1504-T-02. Estudo Histórico, Rio de Janeiro, 2011.

LYRA JUNIOR, Américo Alves de. O Brasil na América: a história das relações internacionais brasileira durante o período de transição entre o Império e a República. Curitiba: Juruá, 2014.

SAMPAIO, Francisco Xavier Ribeiro de. Relação Geographica Histórica do Rio Branco da América Portugueza [1777]. In: Revista do Instituto Histórico e Geographico Brasileiro – Tomo XIII. Rio de Janeiro, n° 18, 1850, p. 251.

SCHWEBEL, João André. Coleção dos prospectos das aldeias e lugares mais notáveis. Reproduzido por MENDONÇA, Marcos Carneiro de. A Amazônia na era pombalina. Rio de Janeiro: Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, 1963.

 

 

 

 

 

 

CAU-RR elege Presidente e Vice-Presidente e Comissões

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Da esquerda para a direita: Conselheiro federal suplente Luiz Afonso Maciel, Cons. titular Rondinelle Albuquerque, Cons. Suplente David Eufrates, Presidente Rodrigo Avila, Cons. suplente Ygor Martins, Cons. Federal Nikson Dias, Cons. Suplente Luciana Nattrodt, Cons. Suplente Max Weber Carvalho, Cons. suplente Sued Trajano, Vice-Presidente Eduardo Marques, Cons. titular Sharonn Torreias.

O Conselho de Arquitetura e urbanismo de Roraima realizou hoje dia 08 de janeiro, sua 107ª Sessão Plenária Ordinária que definiu a nova composição do CAU-RR para o triênio de 2021 à 2023. A sessão contou com a participação dos conselheiros titulares e suplentes, bem como, a participação do conselheiro federal eleito Nikson Dias.

A reunião remota foi conduzida pela conselheira eleita Arquiteta e Urbanista Graciete Guerra Costa.

O arquiteto e urbanista Rodrigo Edson Castro Avila, eleito por unanimidade o novo presidente do CAU-RR e o arquiteto e urbanista Eduardo Oliveira Marques, eleito o vice-presidente. Em outubro de 2020, doze (12) conselheiros, sendo dois (2) federais, um titular e suplentes, e cinco (5) conselheiros estaduais titulares e cinco (5) conselheiros estaduais suplentes eleitos para o triênio de 2021-2023. 

Rodrigo Edson Castro Avila
Presidente do CAU-RR Rodrigo Edson Castro Avila.

O presidente eleito por unanimidade arquiteto e urbanista Rodrigo Edson Castro Avila, é um conselheiro reeleito da gestão anterior que atuou como vice-presidente e coordenou a Comissão de Organização, Finanças, Administração e Planejamento do CAU-RR nos últimos três anos. Dando enfase aos seus trabalhos profissionais nos últimos anos  voltadas as ações de desenvolvimento da Assistência Técnica de  Habitação e Interesses Sociais na América do sul e na Africa. Foi recentemente homenageado pela Câmara Municipal de Boa Vista, por sua belíssima atuação em relação aos refugiados venezuelanos a frente do Engenheiros sem fronteiras. Durante a 107° sessão plenária ordinária fez seu discurso voltado a ações mais atuantes, de forma eficiente, dinâmica e inteligente para propor um melhor atendimento ao profissional, visando a valorização da classe e tendo foco na Assistência Técnica de  Habitação e Interesses Sociais.

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Solenidade de homenagem da Câmara Municipal de Boa Vista.

 

Foi eleito o conselheiro Eduardo de Oliveira Marques para a vice presidência do conselho com  votação também por unanimidade. Arquiteto Urbanista com escritório atuante no mercado, bem como, nas ações voltadas ao exercício profissional dentro do estado.

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Vice-Presidente Arquiteto e Urbanista Eduardo de Oliveira Marques.

Seguindo a pauta foram votadas as composição das Comissões e seus respectivos coordenadores e coordenadores Adjuntos.

COFAP – Comissão de Organização, Finanças, Administração e Planejamento do CAU-RR
– Eduardo Oliveira Marques (coordenador)
– Rondinelle Hudson Pereira de Albuquerque (Coordenador adjunto )
– Sharonn Lorrayne Mendes Torreias

CEPEF – Comissão de Ética, Disciplina, Exercício Profissional, Ensino e Formação
– Graciete Guerra da Costa (Coordenadora )
– Sharonn Lorrayne Mendes Torreias (Coordenadora Adjunta)
– Eduardo Oliveira Marques

CAUERI – Comissão de Politica Profissional, Arquitetônica, Urbana, Ambiental e Relações Institucionais do CAU-RR
– Rondinelle Hudson Pereira de Albuquerque ( Coordenador)
– Graciete Guerra da Costa (Coordenadora Adjunta)
– Eduardo Oliveira Marques

CATHIS – Comissão de Assistência Técnica de Habitação e Interesses Sociais
– Sharonn Lorrayne Mendes Torreias (Coordenadora )
– Graciete Guerra da Costa (Coordenadora adjunta)
– Ygor Martins da Silva

 

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Conselheira Arquiteta e Urbanista Graciete Guerra Costa.

A Construção Civil e a Pandemia

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Aprendi com Dona Neide Selma – Economista da PUC/GO – nas horas vagas MAMÃE, que a economia é cíclica, pois bem, se assim o é, acreditando ser, notório visto, passamos as análises dos últimos acontecimentos. Ao analisar a vida pregressa econômica do nosso país, percebemos em forma de gráficos uma sequência de ondas, ascendentes e descendentes, picos e depressões sequenciais, como que nunca pudesse sempre crescer tampouco sempre descer, sempre buscando uma estabilidade, uma média, por assim dizer.

Bom, investir no pico é fácil, otimismo carregado de euforia, porém com todos acreditando, mão de obra abundante e cara, matéria prima disponível, alta de preços, concorrência começa a saturar levando todos a decréscimos, em contraponto, enquanto tudo vai de mau a pior, quando o gráfico atinge sua maior depressão, temos queda de preços de insumos e serviços, maior oferta de mão de obra e oportunidades que não surgem durante o otimismo do pico máximo.

Na frieza da racionalidade capitalista, investir na depressão é de fato o mais rentável dos desafios, riscos altos que implicam em rentabilidade maior, investir na construção civil durante a crise é contratar mais por menos, comprar barato e vender melhor, afinal a obra ficará concluída na retomada da economia quando o credito se reestabelece, o índice de confiança sobe e o produto precisa estar disponível para o consumo.

A Construção Civil é a indústria que mais cresce e emprega no Brasil, apesar da Agropecuária segurar nossa balança comercial, essa não emprega como as Construção Civil. Fato é, que os principais créditos carreados de incentivos são os imobiliários (vide CAIXA e BB), sempre que qualquer governo precisa alavancar ou resgatar a economia, pacotes imobiliários são lançados (exemplo: Minha Casa Minha Vida). Se deseja construir e reformar, a hora é agora, enquanto a desconfiança paira, mão de obra barata e disponível, indústria reduzindo margens para sobreviver e mercado se preparando para sair da crise pós pandemia, esteja preparado e com produto na mão #ficaadica.

Nikson DiasArquiteto e Urbanista

QUARENTENA EM DOIS MUNDOS

Por Jorge Romano Netto

Arq. Jorge Romano Netto, Presidente do CAU/RR.
Arq. Jorge Romano Netto, Presidente do CAU/RR.

Muito se fala que depois da covid-19, a humanidade não será mais a mesma. Será? Pelo que estamos vendo, parece que ela está se mostrando a mesma.

Este é um tempo especial, no qual precisamos de serenidade, de esperança, de conforto, de consolo diante de uma doença tão devastadora. Precisávamos de um momento para refletir o tempo que estávamos e ainda estamos vivendo. Um tempo de velocidade, com uma avalanche quase incontrolável de informações. Precisávamos também de um momento, para desacelerar. O COVID=19 veio nos proporcionar essa oportunidade.

Ao mesmo tempo em que paramos e refletimos, vemos que o vírus desnudou, ou melhor, que ele colocou, de forma clara, diante dos nossos olhos a realidade que “teimamos em não ver”.

E o que vemos? Politização do vírus. Parece até que ele virou partido, exploração da doença, para desvios de verbas, superfaturamento de remédios, equipamentos e aparelhos de vital importância para salvar vidas. E o que precisamos num tempo como esse, é união, juntar esforços, para lutar contra um inimigo comum.

É esquisito o clima macabro e desolador mostrado por todas as mídias. Quanto a isso, nada de novo, elas continuam as mesmas, pois as pessoas por trás delas, continuam e vão continuar as mesmas. Na realidade, o que precisávamos de fato, era uma campanha de conscientização que nos trouxesse esperança. Ao contrário, assistimos a todo momento, contagem de mortos, covas escavadas aos milhares e anuncio aquisição de caixões. Um clima de terror, atingindo a parte psicológica das pessoas que estão trancafiadas em suas casas.

Bom, alguns tem casa, outros tem um espaço precário, insalubre, insuficiente para o número de pessoas que “habitam” ali. Juntando baixa estima, escassez, falta de trabalho, falta de perspectiva e com as esperanças demolidas, essas pessoas perdem a imunidade e ficam mais suscetível às doenças.

  O COVID-19 esfregou em nossa cara essa realidade. Também revela que “somos os mesmos e vivemos como os nossos pais” (Bechior).  Mesmo em tempos de pandemia, continuamos (como humanidade) a explorar as situações de calamidade para interesses pessoais.

Nós, como individuo, precisamos pensar sobre esse tempo e aplicar nossos valores morais, espirituais, profissionais e técnicos, assim como os nossos dons e talentos. Temos nossas casas confortáveis, bem iluminada, ventilada, equipada com vários eletrodomésticos, internet, tv fechada, com opções de lazer… ouvimos dizer que a casa é a melhor vacina contra o COVID-19. Para esse mundo com as características citadas. No entanto, precisamos enxergar o outro, aquele que vive no mundo, mas numa realidade completamente diferente.

Ficou muito mais evidente, que temos dois mundos superpostos e paralelos. Um dispõe de infraestrutura de primeiro mundo em contraste com o outro que não dispõe de nada. As habitações do segundo, contrastam com as do primeiro. São denominadas subnormais, sem água, saneamento básico, sem energia e muito menos internet. A única opção, quando tem, é uma tv aberta bombardeando a mente de pessoas que já estão com sua autoestima no chão ainda por cima, assistem atônitas as imagens de covas para terminar de enterrar seus sonhos e se enterrar nelas. Ai questionamos: como podemos dizer que esses tipos de “casas” são vacinas contra o CORONA VIRUS? ou são o lugar de ideal para a proliferação do vírus? Se nossa premissa for a de que quanto mais gente infectada, mais rápido atravessamos a pandemia podemos afirmar que sim, é a vacina. Mas antes de tudo, é o lugar propicio a infecção coletiva.

 Diante disso, qual a nossa ação em relação aos nossos semelhantes? E como profissional da arquitetura, o que podemos fazer em um momento como este? Como podemos nos dispor a ajudar a sociedade, na qual vivemos, a atravessar essa pandemia?

Precisamos de respostas urgentes, porém as ações exclusivas na área da arquitetura e construção não são imediatas. Além do mais, estamos caminhando às cegas. Não sabemos quanto tempo vai durar essa situação. Voamos tateando, tentando achar a saída através das tentativas e erros. Um voo no escuro, pois sabemos muito pouco sobre a doença. Não podemos esquecer quem somos. Fomos formados e treinados para pensar e apresentar soluções.

Sabemos também que somos parte de um grupo multidisciplinar que pensa e trabalha juntos para viabilizar as nossas propostas, por isso a construção da solução é uma obra coletiva que envolve outras profissões.

Estamos diante de um grande desafio. Está em nossas mãos, a possibilidade de promover pelas nossas atribuições e ações, qualidade de vida aos dois mundos citados acima, para que eles se tornem um só, mais justo e mais harmônico. Precisamos dar mais atenção a ATHISAssistência Técnica em Habitações de Interesse Social, para que o segundo mundo esquecido pelo poder público e visto pela maioria dos profissionais como composto por cidadãos de segunda categoria, se torne um nicho de mercado de trabalho e desfrute de qualidade habitacional.

Um discípulo pediu ao seu mestre: Por favos diga-me uma frase que que eu possa usar em qualquer circunstância, para meu consolo. Ao que o sábio respondeu: “TUDO TAMBÉM PASSA. Sua maior dor passa, sua maior tristeza passa, assim como sua maior alegria, também passa”. O CAU-RR–  Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Roraima, vem trazer uma mensagem de esperança para esse momento. É repetir a frase do mestre: “TUDO TAMBÉM PASSA”. E quando passar, estaremos preparados para apertamos as mãos, abraçarmos quando necessário para restabelecermos nossos vínculos. Nosso Estado e nossa cidade terá à sua disposição mais de duzentos arquitetos urbanistas, para transformar seus espaços e suas casas em um verdadeiro lar propicio para termos saúde física, mental, social e psicológica.

Durante a quarentena, estes arquitetos discutiram sobre Plano diretos para termos uma cidade mais justa e desenvolvida, fizeram debates e cursos sobre contratos, sobre meio ambiente, sobre a importância da arquitetura, da casa a cidade, do conforto, da acústica, materiais de construções, móveis, etc. Se prepararam para quando terminar a quarentena, pode servir mais e melhor a nossa sociedade.

Serão novos hábitos, novas manias, mas não podemos esquecer que precisamos uns dos outros, que precisamos da empatia necessária para vivermos em harmonia. Precisamos valorizar a vida em todos os seus aspectos. Para isso tivemos uma formação ampla que atinge várias áreas do conhecimento. Precisamos ser os mesmos, mas com visão diferente.

Arq. Jorge Romano Netto, Presidente do CAU/RR.

 

Boa Vista 25 de Maio de 2020

O Autismo e as Cidades

Por Nikson Dias  

conscientização do autismo no mundo
conscientização do autismo no mundo

Abril é o mês da conscientização do autismo no mundo. Entre várias características e necessidades que cercam o espectro, coloca-se a questão do que nossas cidades têm feito para se tornarem mais inclusivas. Nesta data, é importante para nós arquitetos e urbanistas discutirmos como fazer projetos arquitetônicos, requalificações urbanas e reformas inclusivas para todos.

 

Nossa profissão passa por transformações diárias. Como no caso da pandemia da Covid-19, que transformará a forma de projetar ventilações, fontes de iluminação natural e fluxos de circulação. No caso dos autistas, diversos estudos atestam sua sensibilidade para cores quentes, ruídos agudos, ambientes fechados, comunicação visual confusa e falta de hierarquização dos espaços.

 

Com observação meticulosa e poética, sem preconceitos, é preciso deixar a realidade e o lugar falarem diretamente com o usuário. Privilegiar a experiência, a sensibilidade para com o próximo. Mais do que nunca os projetos de Arquitetura e de Urbanismo devem focar na inclusão pela inserção.

 

O Conselho de Arquitetura e Urbanismo sempre trabalha suas iniciativas com base na Agenda 2030 e nos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU. Destaque-se que a acessibilidade aos autistas está diretamente ligada ao vários desses objetivos:

  • Objetivo 03: Assegurar uma vida saudável e promove o bem estar de todos;
  • Objetivo 09: Construção de infraestruturas resilientes;
  • Objetivo 10: Redução da desigualdade entre as pessoas;
  • Objetivo 11: Tornar cidades e assentamentos humanos inclusivos, seguros, resilientes e sustentáveis;
  • Objetivo 16: Promover sociedades pacíficas e inclusivas para um desenvolvimento sustentável.

Observando as necessidades especiais que os autistas apresentam diante dos projetos, percebe-se que essas preocupações não beneficiam apenas aqueles que estão no espectro, mas todos os usuários. Qual escola não necessitária de zonas urbanas menos ruidosas? Qual usuário não se sentiria melhor em ambientes hierarquizados, pensados racionalmente por meio de organogramas e fluxogramas? Quem não deseja calçadas conexas ou transportes públicos sem ruídos e aglomeração?

 

Pensar o ambiente construído para os autistas, tanto na escala arquitetônica como na escala urbanística, é um fazer holístico: ao contemplar as necessidades do espectro autista, o arquiteto atinge todos os tipos de usuários. Dos habilidosos àqueles com dificuldades de locomoção; dos surdos aos ouvintes; das crianças aos idosos. Projetos arquitetônicos não podem ser perfunctórios, precisam vim carregados de sensibilidade, inclusão e principalmente respeito aos usuários.

 

O Dia Mundial de Conscientização do Autismo, assim, reforça essa lembrança: que a inclusão esteja todos os dias em nosso trabalho. Afinal, somos todos uma só comunidade!

 

Nikson Dias é pai do Miguel e Conselheiro Federal CAU/BR.

A empregabilidade da arquitetura vernacular no estilo contemporâneo

Arq. Urb. Ygor Martins

Por Ygor Martins*

No Brasil, devido à dimensão continental de terras e quantidade de habitantes, há grande diversidade de características regionais como clima, relevo e vegetação. Destaca-se também a multidiversidade cultural, que revela estilos construtivos, estéticos e culinários. Cada região do Brasil possui a própria identidade que se adaptou ao longo de anos às peculiaridades locais, e assim nasceram características únicas dos povos que habitam determinado espaço, tempo e lugar, ou seja, as características vernaculares.

Elementos vernaculares, ou elementos tradicionais, espelham características típicas da população e região, criando uma imagem honesta do povo e da cultura. A arquitetura vernacular, em consequência, é representada pelos materiais, técnicas, estilos e demais especificidades que representam a população de determinada região. De acordo com Eduardo (s.d) “A chamada arquitetura vernacular está diretamente ligada à percepção de especificidade e de diversidade e diz respeito aos modos de construir em determinadas localidades […] utilizando técnicas passadas de geração em geração.”

Ademais, no campo profissional da arquitetura, técnicas vernaculares são muitas vezes desvalorizadas e não empregadas mesmo quando possam trazer benefícios ao usuário do ambiente. Segundo Sant’Anna (2013), a pouca utilização de métodos construtivos vernaculares por arquitetos e demais profissionais da construção civil promove o antagonismo da população e dos órgãos competentes em relação à empregabilidade, o que gera preocupações quanto à durabilidade e segurança, muitas vezes causadas pelo desconhecimento técnico e não por fatos concretos.

Construções tradicionalmente erigidas por povos locais tendem a ser adaptadas para as características mais relevantes da região, como a temperatura média, a incidência pluvial, a velocidades dos ventos e demais fatores que profissionais da arquitetura levam em consideração quando projetam edifícios. Os métodos tradicionais, portanto, representam formas construtivas que, em geral, garantem o melhor resultado através da utilização de materiais de obtenção local.

Segundo Veloso (1999), as construções vernaculares produzidas sem o auxílio de arquitetos têm, historicamente, apresentado soluções inteligentes para características climáticas em diversas regiões ao redor do mundo, porém este tipo de construção perdeu espaço para o estilo construtivo internacional, baseado em vidro, concreto e aço, em meados do século XX.

Ao contrário do pensamento popular, muitos métodos construtivos vernaculares não são inferiores aos convencionais e, quando bem desenvolvidos, podem prover os mesmos benefícios e onerar menos o construtor. Numa sociedade que corriqueiramente exerce a autoconstrução, a utilização de métodos construtivos menos onerosos e de boa qualidade pode garantir ao cidadão de baixa renda o resultado desejado sem investir em valores altos que, muitas vezes, não dispõe.

De acordo com Eduardo (s.d.), um exemplo de arquitetura vernacular na região norte pode ser encontrado nos povos ribeirinhos que se adaptaram ao relevo e ao clima chuvoso, que promovem o alagamento de grandes áreas, através da construção em palafitas e da utilização de casas flutuantes, demonstrando soluções eficientes para a população tradicional não-indígena. Os métodos construtivos vernaculares se mostram, portanto, como formas adaptadas ao meio e que revelam a sabedoria popular empregada à arquitetura.

A arquitetura vernacular, porém, por decorrência do surgimento através do lento aperfeiçoamento de técnicas e estilo ao longo do tempo, se mostra engessada na forma, o que não permite inovações e aprimoramentos de elementos e, em conjunto com a tradicional utilização de elementos locais, muitas vezes exclusiva, inibe o avanço tecnológico. Para Barda (2007), a arquitetura vernacular não considera a inovação vantajosa e defende que, quando inseridos novos métodos e materiais, o vernáculo se perde e novas tendências tomam seu lugar. O estilo das construções tradicionais é único e imutável, porém a aplicação deste estilo revela resultados variados nas obras.

Cabe a nós, portanto, profissionais e estudiosos da construção, a análise e a experimentação para nos certificarmos que os diversos métodos construtivos que temos à nossa disposição se adequem aos diversos usos e necessidades que precisamos suprir. Em posse de dados que nos permitam especificar as técnicas mais adequadas aos nossos objetos, obtemos resultados de qualidade, com custos reduzidos e preservamos das características culturais da região. Respeitar as peculiaridades regionais, otimizar processos construtivos e garantir o conforto nas nossas obras são conceitos que devemos perseguir sempre. Esse é nosso papel.

*Arquiteto e urbanista formado pela Universidade Federal de Roraima (UFRR); conselheiro suplente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Roraima (CAU/RR).

 

REFERÊNCIAS:

EDUARDO, Agno et al. A Arquitetura Vernacular das 5 Regiões Brasileiras. Universidade Federal de Mato Grosso do Sul–UFMS, p. 1-19.

SANT’ANNA, Marcia. Arquitetura popular: espaços e saberes. Políticas Culturais em Revista, v. 6, n. 2, p. 40-63, 2014.

VELOSO, Maísa. Adequação da Arquitetura a climas quente e seco: o caso da Arquitetura vernacular do sertão nordestino. 1999.

BARDA, Marisa. A importância da arquitetura vernacular e dos traçados históricos para a cidade contemporânea. 2007. 154 f. Dissertação (Mestrado – Área de Concentração: História e Fundamentos da Arquitetura e Urbanismo) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2007.

A sustentabilidade na arquitetura e no urbanismo

 Por Pedro Hees*

Há muitos questionamentos sobre as possibilidades de soluções ou tecnologias sustentáveis na arquitetura e urbanismo, com o desconhecimento de novas alternativas que tornam mais econômicas o dia-a-dia das construções.

Equipamentos e tecnologias que surgem trazendo soluções adequadas aparecem a cada dia, muitos causando estranheza por falta de informação. Contratar profissionais com os devidos conhecimentos irá colaborar na eficiência do espaço construído, seja sua própria residência, conquistando o sonho da casa própria ou seu espaço de trabalho, convívio ou lazer.

A utilização dessas alternativas depende sempre do local onde se pretende erguer a construção, como o terreno a ser ocupado, os afastamentos exigidos pela legislação local, os métodos construtivos a serem utilizados e soluções sustentáveis que irão gerar o conforto e economia necessária, mais ainda em tempos de crise econômica.

O “simples” fato de erguer a construção, suspensa do solo, permitindo a circulação de vento também na parte inferior da edificação causa muita estranheza e ainda bastante preconceito. Soluções estas utilizadas por população de baixa renda, ribeirinhos da região amazônica, utilizam essa cultura há bastante tempo, a fim de evitar alagamentos nas altas dos rios e igarapés em tempos de chuva, proporcionando “involuntariamente” conforto térmico em suas residências.

Essas técnicas locais e muitas outras foram percebidas e identificadas por um grande nome na arquitetura na Amazônia. Severiano Mario Porto, formado pela Universidade do Rio de Janeiro, mudou-se, a convite para Manaus, onde percebeu soluções eficientes nas construções mais modestas, onde utilizou essas técnicas em suas obras e foi reconhecido internacionalmente com sua arquitetura singular e inovadora.

O cavaco como cobertura se mostrou eficiente no conforto ambiental no interior de suas obras, em conjunto com esquadrias em venezianas moveis onde se controla a ventilação desejada, visto no complexo de Balbina–AM, de autoria de Severiano, infelizmente deteriorado pelo descaso e falta de manutenção.

 Grandes beirais impedindo a incidência solar nas alvenarias e o aproveitamento máximo das condições climáticas de nossa região de clima tropical úmido são algumas das soluções encontradas por este brilhante profissional.

Hoje, algumas alternativas são utilizadas, muitas proporcionando a eficiência almejada outras sem tanto sucesso. Coberturas verdes estão sendo cada vez mais vistas em nossa região, impedindo a transferência direta de calor para a edificação, possibilitando a captação de água da chuva para utilização em esgotamentos sanitários ou mesmo aguar o jardim em épocas menos chuvosas. Muitas vezes essas soluções utilizadas independente de demais outras soluções não darão o resultado almejado na edificação.

Fácil percebemos que simples e costumeiras soluções encontradas aqui dão o conforto procurado, como a utilização de coberturas em palha de buritis ou outras palmeiras, quando bem instaladas e com utilização de materiais adequados, tem longa durabilidade, necessitando sempre de manutenção como qualquer outra construção.

A utilização de “pau-a-pique” vista em muitas construções no sertão nordestino são eficientes na absorção do calor externo não transferindo para o interior. Esta técnica é eficiente numa região árida, e se tornaria ineficiente na Amazônia pelo alto índice pluviométrico. O uso de aditivos e outros tantos materiais já foram utilizados mostrando adequadas e resistentes soluções.

O aproveitamento da iluminação natural de forma adequada, sem a insolação direta dos ambientes aliada ao aproveitamento da ventilação natural é uma alternativa para a redução do custo de energia elétrica, evitando a utilização de climatizadores. Os surgimentos de vidros com películas internas ou esquadrias com vidros duplos melhoram a temperatura interna bem como a absorção de ruídos externos.

A captação de energia elétrica com painéis solares está sendo vistos a cada dia, com ampla utilização em comércios e residências, reduzindo significativamente as contas de energia, bem como as lâmpadas e luminárias em led, hoje facilmente encontradas no comercio local. Muitas concessionárias de energia do país já estão incentivando a utilização desses equipamentos, inclusive propondo a compra da energia produzida e não utilizada nas unidades, porem, ainda com custos elevados para implantação em grande escala.

Em Boa Vista, em particular, vemos muitas alternativas sustentáveis involuntárias na urbanização da cidade, com o plantio de arvores em terrenos, proporcionando microclimas individuais, que em conjunto colaboram na melhoria do conforto térmico das ruas. Podemos perceber o quão a cidade é arborizada quando sobrevoamos nossa capital ou mesmo ao simples fato de nos afastarmos das aglomerações urbanas, observando a paisagem natural do entorno da cidade.

O papel do arquiteto e urbanista esta sendo, a cada dia, vivenciado, mas ainda muitas vezes despercebido. O espaço que habitamos, a sala que recebemos os amigos, os quartos que repousamos, a cozinha que preparamos simples tira-gostos ou requitadas refeições, o convívio no trabalho com circulações adequadas e espaços ergonomicamente corretos, as ruas que trafegamos ou as calçadas utilizadas para caminhadas ou exercícios, sempre terá a presença de um arquiteto e urbanista.

 

*Especialista em Reabilitação Ambiental, Sustentável e Arquitetônica (UnB); Arquiteto e Urbanista formado pela Bennett(RJ); e presidente do Conselho de Arquitetura e Urbanismo de Roraima (CAU/RR).

 

O que é ser Arquiteto?

Conselheiro Nikson Oliveira

Por Nikson Dias de Oliveira*

Pode até parecer acaso, mas não é. Tudo se encaminha a um propósito, isso para quem acredita no futuro moldado ao pré-determinado. Eu acredito no realizável, desde que se deseje, lute e busque o alcance da meta sonhada.

Repentinamente nos deparamos com o universo de atividades que necessitam de ideias, decisões, análises, ponderações e, pelo incrível que pareça, dos sentidos mais primitivos, mesmo que possa contrariar o mundo.

Ser arquiteto é pensar nos espaços habitáveis e não habitáveis, nos fluxos de energia e de pessoas. Ser arquiteto é ser sonhador, o mago que transforma esses sonhos em realidade. Igualmente, ser arquiteto é saber do ideal e conviver com as mazelas impostas pela vida moderna, conhecer a teoria do bem-viver e tentar expressar tudo em forma de projeto e, num futuro próximo, ver a ideia distorcida, anarquizada e desordenada – cruel destino de cidades planejadas como Brasília e outras que foram propostas para demandas e propósitos e depois deturpadas no uso e aplicação pelos usuários.

O arquiteto é o malabarista de ideias, o mentor de sonhos alheios, o detentor das ferramentas capazes de administrar as economias da vida desconhecida e, ainda, converter em moradia o lar ou em qualquer materialidade desejada nos planos de trabalho onde se possa viver, trabalhar, descansar e se divertir.

Provavelmente estereótipos podem ser formados, com fragmentos de verdade ou ilusão, mas o que seria da humanidade sem as possíveis soluções ou as prováveis ideias se não fossem as perguntas? Que sentido fariam as respostas se a necessidade do bem viver não existisse? Que sentido faria o arquiteto sem as ideias protótipos?

Para os criacionista Deus é o arquiteto do universo, criou o mundo e tudo que nele há. Para os evolucionistas tudo é mutável e evolui conforme a arquitetura das partículas, se adaptam conforme os espaços que vivem. Pois bem, não quero dizer que somos deuses e detemos o conhecimento que altera ou rege as evoluções. Quero afirmar categoricamente que se o indivíduo é criativo, questiona a forma de viver ou tem sentimentos pela forma do homem usar os espaços. Esta afirmação é forte candidata a imprimir o “ser arquiteto”.

Lembro bem da vez me questionaram em sala de aula: – Professor, em que área de conhecimento se enquadrava o Curso de Arquitetura e Urbanismo? Certamente é difícil a pergunta, mas ao ponderar o que realmente o arquiteto promove, cheguei à conclusão exata e explicarei como exemplo certo casal com dois filhos que solicita o planejamento da residência. Casa esta que servirá de abrigo, lar de paz e concórdia. Assim, começa a entrevista a fim de conhecer os moradores: o que gostam? Como se comportam? Hobbys? Como se vestem? Costumes diurnos e noturnos? Hábitos culturais e religiosos? Tudo para entender como o cliente deseja se sentir na própria casa – neste momento o casal despeja todos os sonhos, dos mais audaciosos aos mais básicos. Sugerem cor e dimensões de arquitetura. Neste momento, o profissional põe o lado da psicologia para funcionar, além de ser mediador para que não haja conflito entre o tamanho da cozinha e a quantidade de vagas na garagem; entre o depósito para guardar as “tralhas bagunçadas” do marido e o lugar onde serão guardadas as quantidades de sapatos da esposa. Onde organizar tudo isso? Bom, até aqui, tratamos das ciências humanas.

Passemos para outro momento. Ao iniciar os esboços, croquis, volumes e formas, o arquiteto precisa dimensionar os espaços, analisar a ergonomia, testar a acessibilidade, os raios de aberturas das portas, a altura do pé-direito, tamanho de escada e altura dos degraus, larguras dos patamares, inclinações de rampas e telhados, acesso de serviços, acesso social, fluxograma, funciono-grama, organograma, layout, circulações, instalações hidro-sanitárias, instalações elétricas, sistema estrutural a ser aplicado. Ufa! É muita coisa. Daí, concluiu-se que estamos tratando de ciências exatas, não resta incertezas.

Noutro passo, como ainda não foi dado início ao projeto, precisamos caminhar mais adiante, desta vez, na análise morfológica e lógica da residência. E aí que entra o estudo do terreno – topografia, vegetação existente, posição em relação aos ventos predominantes e como utilizá-los e captá-los. Outra análise é sobre carta solar a fim de setorizar os ambientes e as respectivas posições, os locais onde se deseja a incidência solar, bem como onde não se deseja. Ainda, verificamos as intervenções de proteções vegetais ou artificiais para melhor aproveitamento térmico e acústico. Outro estudo é a inserção do paisagismo na concepção residencial, uma vez que para a produção da fotossíntese a planta necessita do sol ou mesmo a análise das árvores com grandes raízes, pois elas podem danificar as instalações hidro sanitárias. Em contraponto, em nossa cidade a sombra da árvore é vital para lazer e o bem-estar térmico, daí surge o valor da cobertura vegetal para promoção de sensação natural e conforto ambiental. Bom, estamos tratando da aplicação das ciências biológicas.

O conceito de arquitetura e o ser arquiteto advém do turbilhão de ideias e análises. A conclusão que chego para responder à pergunta feita em sala de aula pelo aluno, é que a arquitetura perpassa pelos conceitos das ciências humanas, exatas, biológicas ou misto de tudo isso atrelado à arte. Sem dúvidas, a arquitetura se faz, refaz e transpassa os estudos multidisciplinares, por isso jamais chegaremos ao conceito finalizado. Então se eu pudesse classificar em que ciência se aplica a arquitetura diria: Ciência Universal.

Tudo parte do princípio idealizador. Cada ideia é fagulha e centelha que por probabilidade remota pode tornar traço em realidade. O turbilhão de ideias precisa ser organizado, ordenado e questionado, tudo de forma disciplinada para se chegar ao projeto – a prova de fogo do arquiteto!

Em resumo, ser arquiteto é ser ordenador de ideias, transformador de sentimentos, materializador de possibilidades. É ser o construtor da cidade. Ser arquiteto é dar uso aos espaços públicos e privados. Quando você olha crianças brincando na praça ou pessoas indo e vindo nas vias da cidade, ali está o trabalho do realizador de sonhos – o arquiteto e urbanista.

* Arquiteto e urbanista, engenheiro de segurança do trabalho, professor da Universidade Federal de Roraima (UFRR) e Conselheiro do Conselho de Arquitetos e Urbanistas de Roraima (CAU/RR).